Tá todo mundo tentando
As dificuldades de viver em SP, o fim de Curb Your Enthusiasm e a temporada mais recente de Hacks
Acho que a maioria das pessoas deve ter conhecido a newsletter Tá Todo Mundo Tentando, da Gaía Passarelli, em algum momento. Pra mim, foi quase um manual de sobrevivência durante a pandemia. Eu esperava toda sexta pra saber o que ela estava tentando. Eu tava tentando apenas sobreviver.
A pandemia passou, e a Gaía continuou tentando e conseguindo fazer muitas coisas. As crônicas continuam, mas ela também escreve ficção, dá dicas de coisas pra fazer em São Paulo, aulas sobre newsletter e agora lança esse novo livro (ela já tem um livro de viagens publicado chamado Mas Você Vai Sozinha?). E ainda vem mais dois por aí. Eu estive no evento de lançamento do Tá Todo Mundo Tentando e fiz algumas perguntas pra ela. Ela explicou que a ideia, quando sentou para conversar com a editora, foi percorrer um pouco da carreira dela e fugir da caixinha de livro de pandemia.
O livro é dividido em três partes. A primeira parece bastante com a newsletter, e realmente são de textos selecionados entre os mais populares e os que ela mais gosta. Uma segunda parte tem relatos de viagens pelo mundo e a terceira direciona o olhar para São Paulo. Me agrada a relação que ela tem com a cidade, como se fosse um relacionamento tóxico que você não consegue se desvencilhar. Com tudo que SP tem de legal, parece sempre que ela te obriga a entregar um pouquinho mais do que você estava esperando.
O último texto é o meu preferido. Com título de Hurricane, ele conta a história de um irlandês que vem para São Paulo e abre um bar em uma região que passa por uma gentrificação. É um resumo dessa cidade. Paixão, esforço, amizades, esperança, problemas financeiros, desfiguração de um bairro pela especulação imobiliária, violência. Tá tudo ali.
Esse conto me fez pensar na vida. No sábado, fiquei sabendo que um amigo está pensando em deixar São Paulo. Eu não sou daqui e conheci muitas pessoas de fora no trabalho, algumas viraram mais do que colegas de jornalismo. Então sempre existe essa discussão. A cidade é tratada como uma entidade viva, que te faz mal. Quem nunca disse a velha frase “eu não aguento mais São Paulo” como quem se refere a um parceiro que pisa na bola demais? Eu já. Enfim, tudo isso pra dizer que não importa quantos legais as construtoras derrubem para erguer mais um prédio enorme e feio, e o barulho que vem com isso. A cidade só fica mais insuportável quando alguém que você ama desiste dela.
Cara, você tem que ouvir (e ver) isso
Eu estive no último Primavera Sound Porto e fui “arrastado” para o show do Lisabö, uma banda espanhola que canta em catalão, por um casal que dividiu uma árvore comigo enquanto eu me protegia da chuva. Eles fizeram um show com a projeção da bandeira palestina ao fundo e muito barulho. Daquelas raras bandas com duas baterias, mesmo que na maior parte do tempo os dois bateristas toquem as mesmas coisas. Recomendo.
É inacreditável o que a música faz. Mesmo com todos os perrengues que os organizadores deixaram acontecer, incluindo o cancelamento do Justice horas antes do show, quando o Jarvis Cocker começou a rebolar naquele palco, tudo ficou bem. Existem algumas pessoas que dizem que o Pulp venceu a guerra do britpop (que teoricamente seria entre Blur e Oasis), mas eu discordo dessa afirmação. Não existe qualquer sentido para essa verdade. Os integrantes das duas bandas sempre arrastaram multidões e mesmo quando as bandas acabaram (o Blur sempre acaba voltando) os integrantes sempre tiveram mais sucesso nas suas carreiras solo do que o Pulp jamais fez no seu auge. No próprio Primavera eles tocaram fora do palco principal (o headliner foi o The National). O Pulp também é a banda menos pesada dos três, mas o magnetismo do Jarvis Cocker é as letras dele fazem esse tipo de comparação não parecer absurda. Ele consegue ser desengonçado e sexy ao mesmo tempo. Consegue armar um acompanhamento de palmas da plateia em Disco 2000 e fazer todo mundo ficar em silêncio em Like a friend. Se você nunca viu um show do Pulp, tente.
Recentemente eu assisti à temporada mais recente de Hacks e ao último episódio de Curb Your Enthusiasm. Duas séries sobre comediantes. Enquanto Larry David interpreta a si mesmo e aposta em um mais do mesmo até o fim, Hacks tem uma evolução muito legal de suas protagonistas. Curb tem até um final parecido com Seinfeld, uma homenagem à série que deu uma carreira e um caminhão de dinheiro ao Larry David. O mais legal dessa nova temporada de Hacks é como Ava passa de uma mosca morta que só faz merda para uma pessoa mais ambiciosa e que assume suas responsabilidades, mesmo que ela se mostre completamente sem jeito em várias situações (e talvez esse seja o charme da personagem).
Agora é esperar The Bear.
"A cidade só fica mais insuportável quando alguém que você ama desiste dela." Maravilhoso isso! <3
Gaia é demais!